por Dário de Araújo Cardoso*
[ Parte 1 ] [ Parte 2 ] [ Parte 3 ] [ Parte 4 ] [ Parte 5 ] [ Parte 6 ] [Parte 7 ] [ Parte 8 ] [Parte 9 ] [ Parte 10 ]
“eu nunca encontrei um texto que não possuísse uma estrada para Cristo” (Spurgeon)
- A Proposta e as Razões da Pregação Cristocêntrica
Na história da igreja deve ser lembrada a bem conhecida máxima de
Agostinho: “No Antigo Testamento o Novo é latente; no Novo, o Antigo é
patente”. Ele escreveu que há significados escondidos nas Escrituras
divinas que devem ser investigados da melhor forma possível, mas sempre
com a certeza de que todos os eventos históricos e a narrativa deles são
de alguma forma a prefiguração de eventos futuros e devem ser
interpretados somente com referência a Cristo e sua igreja. Avançando
para a Reforma encontra-se Lutero afirmando convictamente que o
testemunho de Cristo é o critério não somente para a boa pregação, mas,
antes de tudo, para a avaliação dos livros bíblicos. Ele escreveu: “Em
toda a Escritura não há nada a não ser Cristo, em palavras simples ou
palavras complicadas”. “Se olharmos seu significado interior, toda
Escritura é somente sobre Cristo em todo lugar, ainda que
superficialmente possa parecer diferente.” Para compreender esse
significado interior, Lutero procura ler o Antigo Testamento à luz do
Novo. Ainda que não seja tão enfático quanto à abrangência, Calvino
deixa claro o seu entendimento acerca da importância de buscar o
conhecimento de Cristo no Antigo Testamento:
… nós devemos ler as Escrituras com o expresso propósito de encontrar Cristo nela. Quem quer que se desvie desse propósito, embora possa fatigar-se por toda a sua vida no aprendizado, nunca alcançará o conhecimento da verdade; pois que sabedoria podemos ter sem a sabedoria de Deus?… Por Escrituras, é sabido, aqui se quer dizer o Antigo Testamento; pois não foi no Evangelho que Cristo primeiro começou a ser manifestado, mas, tendo recebido testemunho da Lei e dos Profetas, ele foi abertamente exibido no Evangelho.
Calvino observa que a compreensão sobre Cristo não é tão clara no Antigo
Testamento quanto é no Novo, mas isso não significa que o testemunho de
Cristo não esteja presente e suficientemente claro aos que buscam por
ele. Para Calvino, Cristo está presente no Antigo Testamento de três
formas: como o eterno Logos, como promessa e como tipos, imagens e
figuras. Greidanus aponta que não há dúvida de que Calvino cria
profundamente na presença de Cristo no Antigo Testamento, mas destaca
que, por alguma razão, ele não demonstra sentir-se obrigado a destacar
essa presença em todo sermão. De fato, a maioria dos sermões de Calvino
sobre o Antigo Testamento são mais bem descritos como teocêntricos.
A despeito de toda essa referência, a seguinte ilustração citada por Spurgeon nos parece por demais chocante.
Um jovem tinha pregado na presença de um respeitável teólogo, e ao final foi até o velho ministro e disse: “O que você achou do meu sermão?”. “Um sermão muito pobre de fato”, ele disse. “Um sermão pobre?”, disse o jovem, “ele me custou um longo tempo de estudo”. “Sim, disso eu não duvido”. “Por que você não acha que minha explanação do texto é muito boa?”. “Oh, sim,” disse o velho pregador, “é muito boa de fato”… “Diga-me porque você o considera um sermão pobre?” “Porque,” disse ele, “não há Cristo nele”. “Bem”, disse o jovem, “Cristo não estava no texto; nós não devemos pregar Cristo sempre, nós devemos pregar o que está no texto”. Então o idoso disse: “Você não sabe, rapaz, que de cada cidade, cada vila ou vilarejo na Inglaterra, onde quer que esteja, há uma estrada para Londres? … Da mesma forma em cada texto da Escritura, há uma estrada… para Cristo. E meu caro irmão, seu trabalho é, quando chegar a um texto, dizer: ‘Então, qual é a estrada para Cristo?’ e então pregar o sermão, percorrendo a estrada até… Cristo. E… eu nunca encontrei um texto que não possuísse uma estrada para Cristo, e ainda que eu ache um que não tenha uma estrada para Cristo, eu faria uma; eu passaria por cima de cercas e valas, mas eu chegaria a meu Mestre, pois um sermão não pode fazer nada de bom a menos que tenha o perfume de Cristo nele
Essa ilustração não deve ser entendida como se a tarefa de pregar Cristo
em todos os sermões devesse ser executada a qualquer preço, inclusive
daquelas normas de interpretação que são prezadas por manterem os
pregadores fiéis ao ensino proposto pelo texto. Porém, isso deve ser
feito como expressão da convicção de que essas normas levarão ao
testemunho de Cristo. A questão que se impõe, portanto, é se é possível
ser fiel ao significado do texto, um baluarte do método
gramático-histórico, e, ao mesmo tempo, imitar os ícones do passado que
pregavam somente Cristo. Por outro lado, considerando o testemunho do
Novo Testamento e da história, é preciso questionar se os pregadores
contemporâneos têm sido fiéis ao significado do texto do Antigo
Testamento se, ao contrário do que disseram Jesus e os apóstolos, não
percebem o modo como esse texto testemunha de Cristo. Greidanus coloca a
questão da seguinte forma:
O que é importante para os pregadores contemporâneos é o seguinte: se o
Antigo Testamento realmente evidencia Cristo, então só somos pregadores
fiéis quando fazemos justiça a essa dimensão em nossa interpretação e
pregação do Antigo Testamento. A tragédia está em que a exegese
histórica contemporânea, que procura com tanto empenho recuperar o
significado original do Antigo Testamento, geralmente ignora essa
dimensão. Embora Cristo seja retratado no Antigo Testamento, pregadores
cristãos atuais muitas vezes deixam de notá-lo.
Evidentemente a amplitude do tema nos impede de tratar dessa questão sem
impor-lhe limites. Para este estudo foi selecionada a pregação
biográfica por ser um aspecto razoavelmente específico da pregação no
qual a questão da pregação cristocêntrica adquire evidente importância.
Será bastante explorado um antigo livro do professor Greidanus, Sola
Scriptura – Problems and Principles in Preaching Historical Texts, onde
ele expõe uma controvérsia ocorrida na Igreja Reformada Holandesa sobre
o que ele denominou “pregação exemplarista”. Colocando de maneira
simples, “a disputa era que os pregadores sobre os textos históricos
apresentavam as pessoas mencionadas nos textos como modelos a serem
imitados, como exemplos a serem seguidos – daí o termo ‘pregação
exemplarista’.” Pregação biográfica e pregação exemplarista não são a
mesma coisa, mas serão tratadas em correlação por ser perceptível, como
se verá na próxima seção, que a pregação biográfica de nossos dias é
predominantemente exemplarista. O intuito final será, então, propor uma
abordagem cristocêntrica para os sermões biográficos.
Por John Piper. © Desiring God. Website: desiringGod.org
Original: John Piper – Should preachers preach Christ from every text of Scripture? Website: youtube.com/desiringGod
Tradução e Legenda: voltemosaoevangelho.com
Fonte: Voltemos ao Evangelho Divulgação: Massoreticos
Nenhum comentário:
Postar um comentário